A Arte de (Re)Encontrar o Nosso Caminho

A convite da Filipa Laranjeira, CEO da Newmanity project, escrevi um artigo sobre o meu tempo de lazer, as minhas viagens e o JustGo.

A Arte de (Re)Encontrar o Nosso Caminho, espero que gostem!

“Viajar é o meu passatempo favorito! Nisto, não sou diferente de uma grande maioria de pessoas.
Quase todos nós esperamos, ansiosamente, por uns dias em que possamos desligar do trabalho e da rotina do dia-a-dia para os ocupar a fazer aquilo que mais nos agrada. Quando aquilo que mais gostamos é viajar, esse período começa muito antes com a programação e a organização da viagem, ou seja, a viagem inicia-se antes da partida, o que acho maravilhoso!
A diferença está no facto de me deslocar numa cadeira de rodas, o que transforma os meus períodos de descanso, por vezes, em momentos de algum stress, principalmente, quando resultam em viagens. Mas, cada vez mais, vou-me habituando e fazendo com que viajar seja um momento de descontracção. Em cada viagem que faço, tenho sempre mais algum desafio a ultrapassar, o que faz com que, na próxima, vá mais precavida para evitar surpresas. Claro que os destinos são diferentes e aquilo que me espera também mas, de um modo geral, vou-me adaptando de maneira a poder aproveitar o mais possível os meus momentos de lazer.
Planear uma viagem é um processo que nos traz, à partida, algum prazer. Há que explorar o local, escolher o que visitar, onde dormir, quais os transportes a usar, etc. Planear uma viagem para quem tem mobilidade reduzida torna-se ainda um pouco mais complicado. Começo por fazer muita pesquisa na Internet, por vezes, tenho mesmo que ligar para reservar transportes (comboio, barco, entre outros…) uma vez que nem sempre há opção que contemple quem assim se desloca e é importante avisar porque pode haver constrangimentos a ultrapassar. Arranjar hotel com quarto adaptado e disponível nem sempre acontece à primeira tentativa mas, vou ganhando cada vez mais experiência e alguns truques para ir minimizando as complicações, como a que me aconteceu ao chegar a Madrid, já de noite, pensando que tinha hotel reservado e junto da recepção verifico que não tinham nada registado em meu nome e que o acesso ao elevador era feito apenas por escadas. A situação só se tornou menos desagradável porque foi o próprio hotel a arranjar-nos alojamento num outro local.
Decidi aproveitar as minhas experiências e, através da partilha, tentar ajudar e incentivar outras pessoas nas mesmas condições que eu, divulgando as minhas peripécias e como faço para ultrapassar as barreiras deste mundo que, por enquanto, não está preparado para todos.
Associado a isto, decidi procurar e divulgar as boas práticas do turismo acessível também com o intuito de conseguir, com base numa influência positiva, que cada vez mais locais se tornem acessíveis.
E, depressa o meu descanso se tornou uma carga de trabalhos! Um trabalho que, agora, preenche os meus momentos de lazer, e que faço com muito prazer aumentando os meus conhecimentos do mundo com as pesquisas sobre os destinos e com aquilo que experiencio e vivo.
De facto, tenho sempre que ultrapassar uma série de situações, por vezes complicadas, para conseguir o mesmo que outras pessoas. Sou posta à prova mas, garanto que, no final, além do prazer que tirei do passeio, quando regresso, tenho também o sentimento de vitória por ter conseguido vencer mais uma série de barreiras! Tudo isto me torna mais forte, mais confiante e preparada para o que vier. É muito, muito, gratificante!
Um dos episódios mais caricatos que tivemos, eu e o meu marido, foi em Hong Kong. Quando demos por nós, parecíamos personagens de um filme de espiões em terra do inimigo. Queríamos, apenas, passar uma estrada de um lado para o outro, coisa que em Hong Kong, normalmente, só se faz por passagens aéreas ou subterrâneas por entre os prédios. Como apenas encontrávamos escadas, pedimos ajuda a uma senhora, muito simpática, que mal falava inglês. A partir daí, fomos passando de mão-em-mão, ou seja, de pessoa em pessoa que nos iam abrindo as passagens secretas (portas e elevadores) às quais apenas acedia quem tinha as respectivas chaves. Iam transmitindo umas às outras qual o destino a que nos deviam levar, sempre em chinês. E nós Íamos confiando. Ninguém falava inglês e, ai de nós que quiséssemos desistir, pois eles tinham uma tarefa a cumprir que iriam levar até ao fim. Já chorávamos a rir mas um pouco fartos de tantas voltas!
O que ganho com as minhas viagens:

. Conheço locais diferentes, exploro cidades, os costumes e a sua história.
.  Ponho-me à prova, obrigando-me a falar com estranhos, a partilhar e aprender com eles.
. Vou a locais menos acessíveis e ultrapasso barreiras físicas.
. Exponho-me a culturas menos avançadas para as quais uma mulher com deficiência e desenrascada parece vinda de Marte! E com isto, espero, contribuir um bocadinho para a evolução do Mundo.
. Faço exercício e, normalmente, emagreço com os quilómetros que faço por dia, principalmente, quando os destinos são cidades.

A riqueza que conseguimos ao interagir com outras pessoas, aquilo que aprendemos numa conversa com um estranho, o que ganhamos ao tentar integramo-nos numa cultura diferente da nossa, são valores que nos trazem um ganho enormíssimo para o nosso desenvolvimento, o que se reflecte naquilo que somos e fazemos. Aplicar tudo isto ao nosso trabalho, seja ele qual for, traz uma grande mais-valia tanto ao nível de criatividade como da produtividade.
Claro que não podemos andar sempre em viagem (alguns conseguem, quem sabe a vida não me surpreende? Adoro surpresas!), por isso tenho muitos outros momentos de lazer e de descontracção, tão importantes para conseguir encontrar um equilíbrio que me traga a concentração e a estabilidade necessárias para a minha vida.
E, como nem tudo é um mar de rosas, ir jantar fora, ir a um bar, a um cinema ou, simplesmente, passear são por vezes grandes aventuras. Ou vou aos mesmos sítios de sempre ou tenho que fazer um planeamento como se fosse de viagem a um local desconhecido. E é assim que um simples momento de descontracção pode resultar numa situação desagradável e incómoda. Ir jantar com um grupo de amigos a um restaurante sem casa de banho adaptada, mesmo que não precise de a usar, deixa-me logo nervosa, sem conseguir aproveitar o momento. Afinal, o que era suposto tranquilizar-me tem um efeito completamente contrário.
Quem passa por uma adversidade como a que eu passei, vê a vida transformada de tal maneira que tem que reaprender a fazer quase tudo. E tem também que aprender a usufruir dos momentos de lazer. Com persistência, tentativa-erro e algum risco vamos conseguindo encontrar a nossa forma, até porque “O caminho faz-se, caminhando” como diz o poeta António Machado. Com isto em mente, os meus momentos de lazer passaram a ser, quase sempre, descontraídos, alegres e desejados, como antes do acidente.
Uma vez, li uma frase do actor Neil Marcus, que tem uma doença degenerativa, a qual acho fascinante: “Disability is not a ‘brave struggle’ or ‘courage in the face of adversity’….Disability is an art. It’s an ingenious way to live”.
Não encarei a minha situação sempre assim mas cada vez mais é assim que quero e vou conseguindo seguir em frente.
Passei a fazer do meu descanso uma luta para construir um mundo que sirva a todos. Talvez seja muito ambicioso mas, se todos contribuirmos um bocadinho, vamos fazendo a diferença.

JustGo!!

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